Jinkings um exemplo de paraense
por Pedro Ayres
Há gente que permanece viva, pela memória e pelo simples fato de que durante toda vida construiu a verdadeira imortalidade. A da obra realizada, a do afeto, a do companheirismo, pelo profundo amor às coisas da nossa terra e do país. Tudo isto e mais um pouco definem a vida de Raimundo Antonio da Costa Jinkings, amigo e companheiro de velhas batalhas.
Conheci o Jinkings no Partidão, em que ambos militávamos. Ele, voltado para a organização sindical e trabalhadora. Eu, junto com Chico Costa, seu irmão Raimundo, Nelito e outros tentávamos dar forma e conteúdo ao Partido no movimento universitário. Desse modo, como tínhamos a visão de unir todos os movimentos num só organismo, com vistas a um futuro mais democrático e participativo para as amplas massas do país, conseguimos construir algo que era sonhado por todos os grupos de esquerda do país, mas que nunca saía do papel, uma efetiva e real Frente Operária-Estudantil-Camponesa.
Naquele período Belém sofria com constantes falta de eletricidade. Era um problema da capital e do Estado, tanto que candeeiros e lamparinas faziam parte dos utensílios de qualquer casa. Se havia alguma diferença social entre esses úteis objetos, ela ficava adstrita aos materiais de feitura, aos desenhos e aos tamanhos. Uns lembravam a Belle Époque, outros, mais modernos, traziam a marca do ecletismo e do neoclássico. Enfim, com estilo ou sem estilo a falta de luz a todos atingia.
O Governador do Estado, Aurélio do Carmo, era um democrata convicto, tanto que a despeito das tendências atrabiliárias e de direita do corpo policial paraense, conseguia garantir que os movimentos populares tivessem seu curso. A luta nacionalista se acirrava no país todo. Nós, pressionados pela carência energética, defendíamos a solução por meio de pequenas hidrelétricas distribuídas regionalmente. Grupos do governos estadual e federal queriam termelétricas, fornecidas pela ITT, a famosa Bond and Share.
Humberto "Vovô" Lopes, Jocelyn Brasil, Serrão, Bené Monteiro e Jinkings eram a base de nosso comando partidário, sendo que ao Raimundo, por sua inconteste liderança sindical, coube a tarefa de coordenar a área operária e camponesa. Como a correlação de forças políticas era bem desfavorável às nossas teses, escolhemos fazer uma greve para pressionar. Tudo correu bem, tanto que até tivemos uma reunião pública com o Governador Aurélio do Carmo, que nos assegurou que iria estudar a nossa proposta. Uma proposta respaldada em estudos do economista Moacyr Paixão. Porém, no frigir dos ovos, com o advento da "redentora", tudo foi feito como queriam as multinacionais.
Esse ineditismo de movimento e de sucesso, pois, bem ou mal, tínhamos realizado o que desejávamos, mais tarde veio a se voltar contra todos nós. Não porque pudéssemos ou tivéssemos condições de outras grandes atividades, mas, pelo medo que causou na direita golpista do Pará e da região. Ficamos tão envolvidos com a sensação de vitória que a Campanha da Legalidade de Brizola criou que nem nos apercebemos do inimigo ao nosso lado. Um inimigo que até posava de nacionalista.
Certo dia, ínicio de 62, Belém é sacudida com a notícia de que agentes do DOPS tinham invadido o Sindicato dos Petroleiros e descoberto um formidável plano para criar núcleos guerrilheiros no Pará e na região. Como sabíamos da íntima ligação entre o serviço secreto do exército e o DOPS pensávamos que era mais uma espécie de atualização de cadastro. Uma atualização muito livre e aberta, em que gregos, troianos e até espartanos entravam na lista. Com a publicação do "dossier", um documento que nunca fez justiça ao talento ficcional de seu autor, mais voltado para terras encharcadas, descobrimos que os objetivos eram: imobilizar, atemorizar e desmobilizar a todos nós, além, é claro, de fazer média com os agentes da CIA que já andavam por lá às mancheias.
O principal alvo era o Partidão e suas lideranças mais jovens, como o Jinkings, Bené Monteiro e alguns outros. Segundo o coronel Jefferson Cardim, na época chefe do Estado-Maior da 8ª Região Militar, tudo tinha sido elaborado por um major da Segunda Secção, que trabalhava a paisano numa estatal. Processos foram abertos, entretanto, não posso dizer se houve ou não inquéritos legais, pois, nunca soube de ninguém que tenha sido ouvido. Mas, também, pouco importava, o Golpe veio logo em seguida e os nossos pesadelos se tornaram realidade.
Foi a partir de 1962, quando fui enviado para o Rio, que perdi o contato com Jinkings, só sabia dele por intermédio do Jocelyn ou do Humberto. Entretanto, na década de 1970, tornou-se o representante, correspondente e distribuidor do jornal "Crítica", do qual era comentarista de política internacional e assim, mesmo indiretamente voltamos a nos encontrar.
Este Blog embora honra e homenageie o Raimundo Antonio da Costa Jinkings, também rende homenagem a figuras como Serrão de Castro, Levy Hall de Moura, Acácio e Jocelyn Brasil. A todos a minha homenagem, o meu sincero agradecimento pelas lições e pela amizade que desfrutei.
Blog do Pedro Ayres
Sexta-feira, 2 de Novembro de 2007
por Pedro Ayres
Há gente que permanece viva, pela memória e pelo simples fato de que durante toda vida construiu a verdadeira imortalidade. A da obra realizada, a do afeto, a do companheirismo, pelo profundo amor às coisas da nossa terra e do país. Tudo isto e mais um pouco definem a vida de Raimundo Antonio da Costa Jinkings, amigo e companheiro de velhas batalhas.
Conheci o Jinkings no Partidão, em que ambos militávamos. Ele, voltado para a organização sindical e trabalhadora. Eu, junto com Chico Costa, seu irmão Raimundo, Nelito e outros tentávamos dar forma e conteúdo ao Partido no movimento universitário. Desse modo, como tínhamos a visão de unir todos os movimentos num só organismo, com vistas a um futuro mais democrático e participativo para as amplas massas do país, conseguimos construir algo que era sonhado por todos os grupos de esquerda do país, mas que nunca saía do papel, uma efetiva e real Frente Operária-Estudantil-Camponesa.
Naquele período Belém sofria com constantes falta de eletricidade. Era um problema da capital e do Estado, tanto que candeeiros e lamparinas faziam parte dos utensílios de qualquer casa. Se havia alguma diferença social entre esses úteis objetos, ela ficava adstrita aos materiais de feitura, aos desenhos e aos tamanhos. Uns lembravam a Belle Époque, outros, mais modernos, traziam a marca do ecletismo e do neoclássico. Enfim, com estilo ou sem estilo a falta de luz a todos atingia.
O Governador do Estado, Aurélio do Carmo, era um democrata convicto, tanto que a despeito das tendências atrabiliárias e de direita do corpo policial paraense, conseguia garantir que os movimentos populares tivessem seu curso. A luta nacionalista se acirrava no país todo. Nós, pressionados pela carência energética, defendíamos a solução por meio de pequenas hidrelétricas distribuídas regionalmente. Grupos do governos estadual e federal queriam termelétricas, fornecidas pela ITT, a famosa Bond and Share.
Humberto "Vovô" Lopes, Jocelyn Brasil, Serrão, Bené Monteiro e Jinkings eram a base de nosso comando partidário, sendo que ao Raimundo, por sua inconteste liderança sindical, coube a tarefa de coordenar a área operária e camponesa. Como a correlação de forças políticas era bem desfavorável às nossas teses, escolhemos fazer uma greve para pressionar. Tudo correu bem, tanto que até tivemos uma reunião pública com o Governador Aurélio do Carmo, que nos assegurou que iria estudar a nossa proposta. Uma proposta respaldada em estudos do economista Moacyr Paixão. Porém, no frigir dos ovos, com o advento da "redentora", tudo foi feito como queriam as multinacionais.
Esse ineditismo de movimento e de sucesso, pois, bem ou mal, tínhamos realizado o que desejávamos, mais tarde veio a se voltar contra todos nós. Não porque pudéssemos ou tivéssemos condições de outras grandes atividades, mas, pelo medo que causou na direita golpista do Pará e da região. Ficamos tão envolvidos com a sensação de vitória que a Campanha da Legalidade de Brizola criou que nem nos apercebemos do inimigo ao nosso lado. Um inimigo que até posava de nacionalista.
Certo dia, ínicio de 62, Belém é sacudida com a notícia de que agentes do DOPS tinham invadido o Sindicato dos Petroleiros e descoberto um formidável plano para criar núcleos guerrilheiros no Pará e na região. Como sabíamos da íntima ligação entre o serviço secreto do exército e o DOPS pensávamos que era mais uma espécie de atualização de cadastro. Uma atualização muito livre e aberta, em que gregos, troianos e até espartanos entravam na lista. Com a publicação do "dossier", um documento que nunca fez justiça ao talento ficcional de seu autor, mais voltado para terras encharcadas, descobrimos que os objetivos eram: imobilizar, atemorizar e desmobilizar a todos nós, além, é claro, de fazer média com os agentes da CIA que já andavam por lá às mancheias.
O principal alvo era o Partidão e suas lideranças mais jovens, como o Jinkings, Bené Monteiro e alguns outros. Segundo o coronel Jefferson Cardim, na época chefe do Estado-Maior da 8ª Região Militar, tudo tinha sido elaborado por um major da Segunda Secção, que trabalhava a paisano numa estatal. Processos foram abertos, entretanto, não posso dizer se houve ou não inquéritos legais, pois, nunca soube de ninguém que tenha sido ouvido. Mas, também, pouco importava, o Golpe veio logo em seguida e os nossos pesadelos se tornaram realidade.
Foi a partir de 1962, quando fui enviado para o Rio, que perdi o contato com Jinkings, só sabia dele por intermédio do Jocelyn ou do Humberto. Entretanto, na década de 1970, tornou-se o representante, correspondente e distribuidor do jornal "Crítica", do qual era comentarista de política internacional e assim, mesmo indiretamente voltamos a nos encontrar.
Este Blog embora honra e homenageie o Raimundo Antonio da Costa Jinkings, também rende homenagem a figuras como Serrão de Castro, Levy Hall de Moura, Acácio e Jocelyn Brasil. A todos a minha homenagem, o meu sincero agradecimento pelas lições e pela amizade que desfrutei.
Blog do Pedro Ayres
Sexta-feira, 2 de Novembro de 2007
Um comentário:
Gostaria de dizer do meu paidégua contentamento em ler o blogo e este post. Moro fora do Pará, mas tenho vivos os fatos e feitos que o Pedrão(P.Ayres), o Chico, o Jinkings, o Alfredo, o Mariano e muitos outros viveram. Senti-me um pouco tendo a minha adolescência de volta, quando fui aluna do Pedro Ayres, em 1961. Mudei por causa dele e deles todos. Hoje sou mais grata do que antes, pois, só agora compreendo que ele me ensinou uma nova e gerenerosa visão do mundo e das pessoas.
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